quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

As ordens


Um tema tem-se vindo imiscuir nas minhas recentes conversas com amigos: o das ordens profissionais. Desde psicólogos, a nutricionistas passando por advogados; todos lidam com a necessidade de serem profissionais certificados.

A priori, o principio parece-me correto: é legitimo que estas atividades sejam tuteladas e sujeitas a princípios de boa prática: a dúvida coloca-se mais ao nível da forma como a coisa é feita.

Quem são os mentores dessas ordens profissionais?; quais os princípios por que se regem?, para que servem as avultadas cotas pagas a essas recém-formadas ordens?; que contrapartidas oferecem aos profissionais certificados e, em última análise,  ao cliente desse profissional.

Notemos que uma ordem profissional é uma associação de carácter privado e que tem por objectivo regulamentar um determinado sector de atividade, favorecendo os interesses dos seus membros: essa defesa pode passar por uma política de nivelamento das tarifas aplicadas ou pelo controle do número de profissionais habilitados a exercer.  Nada obriga a que as decisões sejam tomadas em função do bem comum e não à luz dos interesses dos membros.

Uma amiga minha, psicóloga de formação mas que cumula trabalhos alimentares, queixava-se há dias dos 150 euros que tinha de pagar à ordem a troco de nada. E eu questiono, qual a função social dessa ordem dos psicólogos senão a de favorecer o encarecimento das tarifas aplicadas ao cliente fazendo com que profissões liberais se tornem cada vez mais serviços dirigidos a uma minoria endinheirada.  

Porque é que não há a ordem dos taxistas?, dos operadores de call center? ou dos operários?

E resta-me questionar: qual o papel do Estado dentro de tudo isso?

Em que medida é que é o garante do interesse público, funcionando como eventual contra peso  aos interesses corporativos das ditas ordens?

É que é bom recordar que o boom das ordens a que se assiste atualmente resulta duma vontade política; que é lavar as mãos de qualquer responsabilidade direta ficando com os louros de ter contribuído à organização interna das fileiras; de certo, que o incremento de alguma fiscalidade associada também ajuda.

Aliás o Estado é bom nisso: promover parcerias publico privadas; mandar criar ordens profissionais;  no fundo, privatizar a vida económica desde que não implique custos nem responsabilidades.

Pois eu questiono, se eu for mal atendido por um médico mal preparado?, se eu for lesado por um advogado pouco escrupuloso?, se eu for mal aconselhado por um nutricionista?

Além de uma eventual e pouco provável expulsão da ordem do dito profissional, onde estão salvaguardados os meus interesses enquanto cidadão e consumidor?

Ah é verdade, tenho a DECO: uma associação que me obriga a pagar uma mensalidade para poder fruir dos seus serviços.

Ou seja, é muito bonito promover a criação de ordens numa economia liberalizada mas parece que os nossos representantes políticos esqueceram-se dum ponto central: é que faz sentido quando o Estado, isento de interesses particulares, sabe enquadrar e fiscalizar o trabalho dessas corporações privadas.

Parece-me que a nossa história recente já deu sinais de sobra do perigo que é um país estar entregue a interesses lobísticos para que estejamos agora, cheios de pressa, a privatizar o funcionamento de toda a economia sem acautelar princípios base que salvaguardem o interesse comum.

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