terça-feira, 8 de janeiro de 2013

A mentira


Passei ontem por uma tendinha com livros a cinco euros e acabei por comprar um exemplar que devoro desde então, intitulado: Como falar dos livros que não lemos?

Pierre Bayard,  o autor, é um reconhecido psicanalista e professor de literatura na universidade. E começa este seu ensaio denunciando a tirania da leitura que leva a que a maioria dos seus colegas e alunos mintam permanentemente quanto aos hábitos de leitura. Tratarei no meu próximo post de fazer também eu um mea culpa, mas para já, fico-me pela mentira como tema para este aparte.

Porque se muitos mentem quando afirmam conhecer certo autor, muitos outros também o farão quando exibem currículos nunca validados; veja-se o caso de Artur Baptista da Silva, suposto especialista da ONU, e que foi agora denunciado por nunca ter tido qualquer vinculo às Nações Unidas embora fosse a esse título abundantemente convidado ao longo de meses pelos canais televisivos.

A outra escala, e já aqui falei disso, quem não mente ao apresentar-se em sites de encontros?: mais uns centímetros aqui, uns anos a menos ali, uma foto bem escolhida acolá.

Políticos são reeleitos com panfletos dignos dos melhores guionistas de ficção para não falar dos supostos especialistas que não acertam com uma para a caixa mas que nunca abrem mão dum role infinito de certezas.

Resumindo e concluindo: somos ou tornamo-nos numa sociedade de mentirosos.

Sim, repito: raro há de ser o dia em que não mintamos.

Façam o teste.

Agora, a verdadeira questão é mais a de saber se temos de deixar de mentir ou se temos de passar a reconhecer o conforto que a mentira nos traz?

O que é certo é que o gap entre a realidade e a ficção por todos subscrita conduz-nos à dor: a frustração de não nos sentirmos aceites por aquilo que achamos ser intimamente; o nem sabermos, muitas vezes, o que é que realmente nos move; é que tornou-se difícil sabermos identificar o que é que queremos no meio de tantas imagens que nos vendem o que querem que queiramos.

Recordo-me daquele filme, o mentiroso compulsivo, em que o Jim Carrey, interpreta magistralmente  um sujeito apanhado por uma impossibilidade de mentir. No espaço dumas horas, é toda a vida profissional e afectiva do protagonista que é arrastada para um limbo irreversível. 

Não deixa de ter interesse o questionarmos esse cenário, a título pessoal: o que é que eu poderia perder ou ganhar caso, durante uma semana que fosse,  me visse incapacitado de mentir e de me mentir a mim próprio?

4 comentários:

  1. Mentir para quê? Só se não se gostar de ser o próprio!

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  2. Mas lá está, nem sempre é fácil gostar de si nem deixar de nos compararmos a visões idealizadas de nós próprios.

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  3. mas será considerado também mentir, se não tivermos a consciência de o estar a fazer? a mentira consciente é fácil de controlar (e de apanhar tb;), mas a outra , de mentir a nós próprios, penso ser um pouco mais vaga. infelizmente.

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  4. Precisamente: Eu debato-me tb com essa questão, embora aqui me tivesse ficado pela mentira consciente; já a outra, levar-nos-ia a questionar o que é a verdade e a mentira... E nós aqui, j, n gostamos de questionar o barroco do vazio, né?

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