Passei ontem por uma tendinha com livros a
cinco euros e acabei por comprar um exemplar que devoro desde então, intitulado:
Como falar dos livros que não lemos?
Pierre Bayard,
o autor, é um reconhecido psicanalista e professor de literatura na universidade. E começa este seu ensaio denunciando a tirania da leitura que
leva a que a maioria dos seus colegas e alunos mintam permanentemente quanto aos hábitos
de leitura. Tratarei no meu próximo post
de fazer também eu um mea culpa, mas para já, fico-me pela mentira como tema
para este aparte.
Porque se muitos mentem quando afirmam
conhecer certo autor, muitos outros também o farão quando exibem currículos
nunca validados; veja-se o caso de Artur Baptista da Silva, suposto
especialista da ONU, e que foi agora denunciado por nunca ter tido qualquer
vinculo às Nações Unidas embora fosse a esse título abundantemente convidado ao
longo de meses pelos canais televisivos.
A outra escala, e já aqui falei disso, quem
não mente ao apresentar-se em sites de encontros?: mais uns centímetros aqui, uns anos a menos ali, uma foto bem escolhida acolá.
Políticos são reeleitos com panfletos dignos
dos melhores guionistas de ficção para não falar dos supostos especialistas que não acertam com uma para a caixa mas que nunca abrem mão dum role
infinito de certezas.
Resumindo e concluindo: somos ou tornamo-nos
numa sociedade de mentirosos.
Sim, repito: raro há de ser o dia em que não mintamos.
Façam o teste.
Agora, a verdadeira questão é mais a de saber
se temos de deixar de mentir ou se temos de passar a reconhecer o conforto que
a mentira nos traz?
O que é certo é que o gap entre a realidade e a ficção por todos subscrita conduz-nos à
dor: a frustração de não nos sentirmos aceites por aquilo que achamos ser
intimamente; o nem sabermos, muitas vezes, o que é que realmente nos move; é
que tornou-se difícil sabermos identificar o que é que queremos no meio de tantas imagens
que nos vendem o que querem que queiramos.
Recordo-me daquele filme, o mentiroso
compulsivo, em que o Jim Carrey, interpreta magistralmente um sujeito apanhado por uma impossibilidade de
mentir. No espaço dumas horas, é toda a vida profissional e afectiva do protagonista que é arrastada para um limbo irreversível.
Não deixa de ter interesse o questionarmos
esse cenário, a título pessoal: o que é que eu poderia perder ou ganhar
caso, durante uma semana que fosse, me
visse incapacitado de mentir e de me mentir a mim próprio?
Mentir para quê? Só se não se gostar de ser o próprio!
ResponderEliminarMas lá está, nem sempre é fácil gostar de si nem deixar de nos compararmos a visões idealizadas de nós próprios.
ResponderEliminarmas será considerado também mentir, se não tivermos a consciência de o estar a fazer? a mentira consciente é fácil de controlar (e de apanhar tb;), mas a outra , de mentir a nós próprios, penso ser um pouco mais vaga. infelizmente.
ResponderEliminarPrecisamente: Eu debato-me tb com essa questão, embora aqui me tivesse ficado pela mentira consciente; já a outra, levar-nos-ia a questionar o que é a verdade e a mentira... E nós aqui, j, n gostamos de questionar o barroco do vazio, né?
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