Tenho por hábito,
quando o tempo o permite, de ir ali cruzar uma perna na esplanada do Oliveira,
de caderno e lápis na mão. É uma forma de ganhar alguma perspectiva e de
cheirar o dia.
É comum este
parêntesis ser mobilado pela presença dos alunos do ISCEM, um Instituto
privado situado ali mesmo em frente. É
giro ouví-los e vê-los. Fazem-me com frequência sorrir e sentir mais velho.
Acho piada à mise-en-scène daquelas jovens na moda,
de braço irrepreensivelmente curvado a noventa graus; dos apontamentos “freakolé”
que as distinguem das betas da minha altura; acho graça ainda aos rapazes,
notoriamente menos à vontade nesta coisa do parecer adulto.
Hoje, o grupo que me
calhou ao lado, era composto por três jovens; claro que tinham de estar a fumar
e claro que tinham de estar a criticar. Este é um dos atributos que normalmente
vai de par com o escafandro social próprio dessa idade. A crítica do outro deve
das formas mais fáceis de nos escondermos de nós próprios.
E portanto, da nuvem
tabágica que perfumou este meu parêntesis matinal, surgiu um “eu há dias em que
até comigo me chateio” que me apressei a escrever no meu caderno para aqui
reportá-lo.
É revelador, não é?
O acharmos que o
chatear-se consigo próprio é o suprassumo da indisposição. Claro que antes do
eu, hão de desfilar colegas, amigos, professores ou pais: todos e só em último
caso, eu.
Mas a verdade é que
não me autorizo a ser excessivamente crítico face a esses jovens: Tenho 38
anos; muitos ali têm metade: será que em substância somos assim tão diferentes?
Quando eu tinha a
idade deles não era como eles, no sentido em que acho que nunca pertenci a
nenhuma tribo urbana; penso-me como um eterno solitário, sociável mas diferente;
por definição, diferente.
Talvez extraídos
daquela foto de conjunto, aqueles jovens individualmente sejam também eles
diferentes. Mas o mimetismo com que se
entregam e moldam aos códigos vigentes, só sublinha para mim o quão artificial
são os nossos mecanismos de afirmação social.
Quanto tempo irão
eles um dia demorar a despir estas pesadas vestimentas sociais para voltarem a
tentar ser eles próprios?
Quanto tempo vão eles demorar a despir as vestimentas sociais, perguntas tu. Quanto tempo levamos nós a tentar faze-lo ... e temos o dobro da sua idade.
ResponderEliminarPois, mas o que eu aqui questiono é a necessidade de vestirmos algo para um dia o querer despir. Não haverá forma de nos construirmos sem ser em comparação à norma?
ResponderEliminar