As viagens mais marcantes que fiz até hoje
foram as mais lentas; estou neste momento a viver uma viagem às minhas entranhas
que me tem feito oscilar entre muitas das coisas que desejo e os seus opostos, que quero. É nesse lado profundamente contraditório da
minha pessoa que reside boa parte da minha singularidade.
Talvez, por isso, tenho feito o esforço de
voltar a procurar os livros como companheiros. Há neles espaço para a dúvida, o humor, a ironia, o
erotismo.
A norma é hoje o pós-humanismo mais do que o
humanismo. Já ninguém espera de uma
conversa que faça emergir o que não existia antes dela. Não, agora é suposto
ir-se ao que interessa; ter-se opiniões firmes acerca das coisas.
A própria noção de conversa tornou-se sórdida;
para quê tanta palavra?
Há que ser prático; as coisas têm de ter uma
função; de preferência aqui e agora;
esqueçamos tudo o que conduz à opacidade e contradição do ser humano; é bem
mais fácil ficarmo-nos por conceitos claros; um like aqui; uns sim nãos na linha de apoio técnico; o chamado teste
americano na Universidade pós-Bolonha e a partilha de umas fotos ou músicas na
hora em que queremos exprimir algo de vagamente mais intimo.
Já ouviram falar de Kevin Warwick?
Explorem, vale a pena: o homem que se
autointitula como primeiro cyborg
defende a teoria de que na génese de toda a violência estarão mal-entendidos.
Por isso, preconiza o fim da comunicação verbal como melhor forma de promover
uma ligação direta entre seres vivos, mediada por sensores e tecnologia, e que garanta uma comunicação sem ruído.
É um caso paradigmático e extremo para alguns
mas que tem o mérito de ilustrar uma tendência incontestável para a comunicação
direta, para o open space, para a
cultura da transparência, da visibilidade, do controlo.
Não se trata aqui de ser tecnófilo ou
tecnófobo. Desde os primórdios da história que Prometeu (a técnica) sempre
precisou de Hermes (a linguagem) para construir aquilo a que chamamos hoje a
civilização. Passa-se é que a cultura
tecnológica sofreu tamanhos avanços, nos últimos anos, que deixámos de
considerar a esfera da linguagem como relevante.
Na verdade, os entusiastas da internet,
dir-vos-ão que estamos a criar um enorme cérebro mundial de que cada um de nós
é um neurónio.
Pois digo-vos que esta imagem me gera um
autêntico pavor. Apetece-me logo partir esta merda toda e mostrar o rabo só
para que me excluam da foto de família.
Mas por outro lado, também eu quero ser reconhecido;
por si; estou aqui, neste blogue à espera que me leia. Seria hipócrita dizer
que me basto a mim próprio: que este blogue só serve para materializar o meu eu
intimo.
Estarei, à semelhança do autor de “Is Google
making us stupid?”, Nicholas Carr , já
na fase terminal do humanismo?; incapaz de ler um livro grosso; de estabelecer
um diálogo comigo que não sirva a única função do diálogo com o outro; irei
ainda a tempo de reservar um espacinho na minha vida para os mistérios que habito?
Convido quem tenha interesse por essas questões a ler este post anterior:
ResponderEliminarhttp://godotisback.blogspot.pt/2012/10/a-sociedade-pos-biologica.html