domingo, 7 de outubro de 2012

A nudez


Vou, com este texto, proceder à seguinte experiência: proponho-me partilhar uma reflexão que me desconfortou sem saber, ao certo, onde é que a mesma me levará. A ideia é explorar a escrita como forma de construção ou quiçá revelação de significados.

Pois o desconcerto centra-se num episódio ocorrido ontem nos balneários da piscina que frequento. Estava eu a vestir-me depois de ter tomado um duche quando reparei numa criança, dos seus oito ou nove anos de idade, que o pai estava a vestir perante a passividade da mesma. Enquanto o pai se atarefava da melhor forma, o filho mantinha um olhar fixo e curioso sobre os restantes homens adultos que ali revelavam a sua nudez.

Numa perspectiva exterior, diria ser normal uma criança, não contaminada por pudores de adulto, observar aquele corpo crescido, habitualmente escondido pela roupa.  Mas passa-se que enquanto objecto daquele olhar não consegui manter essa perspectiva exterior. Antes pelo contrário, saí quase que enfurecido daquele balneário. E a questão que aqui coloco é: porquê?

O que é que aquele olhar infantil poderia representar para mim?

Pois poderia aqui evoluir pelo caminho das crianças que, devo assumi-lo, me podem irritar com facilidade quando inundam espaços públicos com barulho e entusiasmo. Mas não era este o caso.

Poderia ainda explicar a minha irritação pelo facto de não me ser agradável ser observado enquanto estou nu ou parcialmente despido. Mas já foram alguns os cenários em que escolhi estar nu junto a desconhecidos sem que isso me fosse desconfortável.

Não, não creio que sejam essas as razões. Mais facilmente me oriento para o facto de ser ali sujeito passivo de uma observação activa;  de não ser conivente na usurpação da minha intimidade.  Um ponto que, por outras palavras, nos conduz a uma noção basilar para mim: a de intimidade e de direito ao pudor.

Estamos aqui a falar da causa pela qual decidi criar um pseudónimo para me poder expor “por inteiro” neste blogue.  Ou seja, só enquanto não for reconhecido é que me permito falar sem pudores; na hora em que sou socialmente reconhecido, entram de imediato filtros e máscaras sociais a respeitar.

É verdade que a fronteira do pescoço está hoje bastante patente. Temos, por exemplo, sites de encontro para adultos em que só aparecem corpos e temos depois redes sociais em que só aparecem caras. O entre-dois, já é do foro de uma intimidade consentida. 

Será esta separação saudável?

O que é que nos leva a esconder o sexo e não o resto?

... Não sei.


Só sei que a curiosidade daquele miúdo confrontou-me à minha própria curiosidade face aquilo que me é escondido.  E acredito que aquele olha infantil trouxesse luz aquilo que me habituei a ver como o lado obscuro das coisas.


É isso, talvez deva admitir que me fui afeiçoando aos fantasmas que escondo no armário.  


1 comentário:

  1. Pois confesso que não fiquei fã do exercício de escrita às cegas mas assumo o resultado e não irei proceder a ajustes.

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