sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O A


Tocou o despertador... Liguei a rádio no iphone; estava uma voz feminina a explicar qual o segredo para não se ter conformado ao papel de vítima face a uma avalanche de azares e problemas. A resposta foi simples: “Criei as condições para poder ser optimista”

Gostei.

Decidi que este haveria de ser também o meu lema: criar as condições para ser optimista. 

Uma escolha simples mas que implica decisões difíceis.  Voltando à voz feminina do despertar, prosseguia dizendo ter integrado atenções relativas ao corpo e ao respeito de si; a isso juntavam-se cuidados ao nível daquilo e de quem se rodeava. 

Aí surgiu-me logo a figura do meu amigo A.

Tem sido um processo complicado este. Já lá vão vinte anos que encontrei um irmão na pessoa do A.  Partilhámos imenso para não dizer tudo.  Sempre fomos muito diferentes numa série de coisas, e nunca foi uma amizade pacífica. O A é um tipo viral que raras vezes deixa os outros indiferentes.  A mim, era uma pessoa que me irritava; tornava-me impaciente.

E os anos não foram ajudando.  É algo que não sei explicar. Cheguei a imputar isso à extrema proximidade que nos ligava.  A verdade é que não há motivos cabais que expliquem a vontade que foi nascendo em mim de me afastar do A. O rapaz é, de facto, uma pessoa com valores pelos quais se rege no seu dia-a-dia; acredita nos seus sonhos e luta por eles; é um homem de afectos com um peito enorme; precisa que o abracem e que lhe dêem amor; é uma pessoa bonita.

Mas é uma pessoa muito agarrado ao que tem e com medo da mudança; foi-se instalando num discurso e numa atitude. As nossas conversas há muito que deixaram de apontar para soluções. Era suposto que nada disso pesasse face a vinte anos de partilha e de confiança. Mas pesou.

Fiz como a tal voz feminina do despertador: decidi, ainda que sem saber ao certo porquê, afastar-me do A. A questão aqui é também aprender a ouvir-me. Há notoriamente algo que não me faz bem dentro desta interacção.  Não creio que a amizade seja isso. Não gosto da pessoa que sou quando fico impaciente ao lado dele. E é verdade que a companhia dele também deixou de me ser agradável.

Será o suficiente para me afastar?

Logo numa altura em que ele enfrenta uma série de dificuldades.

Não é uma decisão fácil. Mas também não creio que manter uma proximidade em nome de um passado seja um argumento de peso. Ainda esta semana ouvi dizer “os maridos passam, os amigos ficam”. Pois não sei: será que essa fidelidade corporiza a substância de uma amizade?

Eu nem na família acredito que haja amores incondicionais; Não sei se é saudável sermos acríticos face àquilo que nos alimenta a alma e os dias. Temos o direito de escolher.

E vou mais longe: sem querer aqui dissimular o egoísmo que preside às minhas escolhas, também acho que este meu amigo precisa urgentemente de operar um conjunto de mudanças profundas na sua vida. Não me apetece caucionar um modo de vida que eu acho desajustado. Não serei bengala deste quotidiano.

No meio de tudo isso, onde ficam as juras passadas de amizade e de fidelidade?

Poderei aqui dizer que estarei ao lado dele se um dia as coisas correrem mesmo mal?

Não se trata de ir ao funeral; trata-se de viver o luto.

Então e se correrem bem? quererei lá estar?

Não se trata de ir à boda, trata-se de viver o namoro.

Enfim, um sem fim de dúvidas face ao qual só me resta escutar-me. Para um tipo cuja cabeça sempre foi o cockpit, deixar a aeronave guiar não é coisa fácil. 

Para quem apregoa o dever de optimismo, não sei se este contributo terá sido dos mais proveitosos. 
f..............
oz feminina do despertador: decidi, ainda que sem saber os porqu. Mas pesou.
 numa titude; izam os seus emas. A

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