terça-feira, 18 de dezembro de 2012

O jogo 1


Nunca fui entendido em matéria de futebol e devo dizer que tenho pena; não tanto pelo jogo em si mas mais pelo tipo de convívio que permite. Serão poucos, hoje em dia, os cenários em que tudo e todos se misturam e abraçam sem estarem, antes disso, preocupados em saber quem é aquele vizinho. 

É isso o que me interessa no futebol: é a capacidade primária que tem de pôr um colectivo a torcer em conjunto por um mesmo objectivo e isso, repito, é algo de valioso.

Bem sei que se  nos demorarmos, veremos que a indústria do futebol encerra em si todos os vícios e mais algum; talvez seja isso que faça do futebol esse pequeno teatro em que nos revemos: reflete aquilo que somos e queremos ser. Haverá melhor encenação do que é ser homem, hoje em dia, do que aqueles onze homens em campo?

É suposto ser-se fiel à equipa, veloz, forte, estratega mas reativo. A isso acresce ainda uma plástica atlética, dinheiro, juventude e vigor. Que mais pedir ?

Convenhamos que tem mais graça discutir as proezas daqueles vinte e dois marujos do que daqueles barrigudos sorumbáticos do parlamento. Porque ao final, estamos a falar do mesmo. O homem e o poder.

Tanto podemos aqui falar de futebol ou política como de playstation ou engate.  Estamos hoje rodeados de jogos cujos alteregos têm a função de representar um eu em potência. É que se noutros tempos éramos pais, vizinhos, amigos, colegas, filhos de Deus ou até eleitores, conseguimos um a um dessacralizar cada um desses papéis para sermos hoje assolados por uma realidade assustadora: somos intercambiáveis e a nossa vidinha interessa a muito pouca gente.

Perante isso, nada como nos afogarmos num presente edulcorado. Revermo-nos de repente na figura do Ronaldo permite, nem que seja só durante noventa minutos,  sairmos da pequenez comedida das coisas.

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