quinta-feira, 6 de setembro de 2012

O poder da beleza


Fui ontem ver “The Asphalt Jungle” à Cinemateca; um filme inserido no ciclo Marilyn, que procura assinalar os cinquenta anos da morte da actriz. Marilyn Monroe nunca exerceu especial fascínio em mim. No entanto, a história dela toca-me. Toca-me a imagem daquela mulher empenhada ao longo da sua carreira em ser algo mais do que uma miúda gira; tocam-me as sucessivas tentativas de se associar ao meio mais intelectual como que para conquistar o respeito mais do que a admiração. Mas mais do que tudo, aquilo que aquela mulher questiona em mim é a importância da beleza.

Por que razão toda e qualquer forma de poder gosta de se associar à beleza?

A ideia atravessa todos os quadrantes: da caricatura do empresário rico acompanhado da menina bonita aos presidentes ou antigos reis que procuram deixar como legado obras arquitectónicas memoráveis.

Aliás, recordo-me de ter ido visitar a colecção permanente da Gulbenkian e de ter atravessado salas repletas de objectos que tinham a vocação de retratar as principais culturas da humanidade: admirei faianças chinesas; kilims árabes; credências europeus... Um sem fim de peças, todas elas bonitas e refinadas. E dei por mim a notar que era, de facto, interessante ver como o que assinala a posteridade de uma cultura é uma determinada visão de beleza. Sabemos lá nós que proezas históricas estão a cargo dos Ming; quantos de nós conhecem seja o que for da cultura persa a não ser através dos tapetes?

Nesse sentido, torna-se interessante questionar que legados deixará a nossa época ao futuro: teremos rotundas com estátuas do Sócrates ou Passos Coelho dentro de cem anos?
Existirão manuais históricos a relatar os grandes feitos de Alexandre Soares dos Santos, rosto da Jerónimo Martins, e hoje homem mais rico de Portugal?

Mais do que isso, haverá interesse pessoal e colectivo em fazer destes actores do nosso presente, os rostos da nossa posteridade?

É interessante observar que a Miss Mundo 2012 é chinesa; no ano anterior fora angolana... Lá estamos nós novamente a querer instrumentalizar a beleza; a querer colá-la aos detentores de outros poderes como que para legitimar e facilitar a sua inclusão nas nossas vidas.

Eu, já me acomodei: reconheço que preciso de beleza na minha vida; procuro-a. No entanto,  tenho pena que os padrões que definem o belo sejam cada vez mais estandardizados; cada vez mais quantificáveis e previsíveis.... Gostava que o belo não fosse uma forma de legitimar mas sim uma forma de reinventar.  Gostava que, através da identificação daquilo que nos toca, fossemos capazes senão de inverter pelo menos de travar a inexorável deificação do poder do dinheiro.

Pobre Marilyn, sabias lá tu os devaneios que ainda me ias inspirar....

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