É interessante
observar a forma como os espaços ocupam hoje o imaginário das pessoas
nomeadamente na hora de pintar o quadro da felicidade.
Aqui no meu mais
recente devaneio perdi-me em projeções futuras e dei por mim a povoar este
imaginário de sítios mais do que de pessoas. Mas se eu questionar boa parte dos
meus contemporâneos com uma pergunta do género se ganhasses o euromilhões que
farias, é provável que a ou as casas constassem dos objetivos bem como algumas
viagens. Dir-me-ão, as pessoas não são compráveis. É por isso natural que não
constem da lista. Mas...
Deixo aqui as
reticências como espaço individual de resposta.
Em que medida é que a
projeção de um espaço interior e mental para um espaço de pedra e cale alivia o
espírito?
É como se o espaço
fosse aqui tido como a matriz absoluta do imutável; daquilo que nos devolve uma
segurança face à impermanência.
Eu sei que tenho
andado a surfar na net na tentativa
de explorar um pouco o mundo do Serge Haroche, prémio nobel de física 2012 e
que se tem notabilizado na identificação do objecto de estudo quântico. Esta coisa do quântico é uma nebulosa na
verdade. Mas de todas as definições que até hoje melhor souberam ilustrar a
matriz quântica, destacaria esta: é como se o espaço e o tempo fossem os dois
vértices de um lençol; a altura é o espaço, a largura o tempo. E digamos que na
visão tradicional do espaço tempo, a interação entre estes dois conceitos afigura-se-nos como proporcional. Isso porque o homem consome sempre em simultâneo um
espaço e um tempo vital.
A questão aqui é que
este lençol nem sempre está irrepreensivelmente esticadinho. Na verdade até
está sempre amarrotado, à semelhança de um lençol ondulado de onde se acabou de
levantar da cama. Quer isso dizer que de acordo com o paradigma quântico, para
se passar de um determinado ponto espácio-temporal para outro, nem sempre é
preciso percorrer a distância espaço/tempo que os separa. Isso porque existem “momentos” em que, no meio
do lençol ondulado, dois pontos espácio-temporais se tocam. E esse toque corresponde
a um corredor de espaço/tempo.
Abre-se aqui uma
porta para viagens no tempo e para um admirável mundo novo cujos principais entraves são os limites da
nossa caixa craniana; da nossa necessidade de pensar dentro de balizas.
Além desses
corredores, há também buracos negros, feitos ralos de bidé em fúria; que sugam
tudo num efeito centrifugador imparável.
E se eu me perco aqui
nesta espécie de viagem pseudo-científica é por achar que quanto mais vislumbro
fundamentos científicos mais percebo que o macro é o espelho invertido do
micro. Olhar para as galáxias e para os
átomos é para o humano, refém das suas balizas empíricas, a mesma coisa.
E nesse sentido, devo
confessar que me continuo a espantar com o meu próprio espanto quando ganho a
consciência dos meus buracos negros e dos meus atalhos espácio-temporais. Basta
às vezes um cheiro e lá estou eu catapultado para a cozinha da minha infância
ou para o caís matinal do comboio que me levava para a escola; e estou lá com
uma intensidade sensorial desconcertante.
Soube aliás que a
zona do cérebro onde se inscrevem as memórias oníricas é a mesma que a das
memórias vividas. Daí que um pesadelo tenha o mesmo potencial corrosivo que um
trauma vivido. Claro que vendo isto de
outra forma, um imaginário irrigado pode iluminar a célula de qualquer recluso,
como nos mostra o Vagabundo das Estrelas
do Jack London.
Pronto, está visto
que hoje me perdi por aqui... Vim parar a este baldio da mente que não era nada
daquilo que eu antecipava. Mas lá está, é esta minha imprevisibilidade que faz
de mim um fragmento deste cosmos por vezes caótico, com buracos negros e a um cheiro de distância de uma
criança de seis anos.
Eu sempre achei uma certa "piada" aos pesadelos, pois é algo que pude "vivenciar sem viver". Além disso, porque nem me lembro de os ter tido! Por outro lado, quando sonho e me lembro do que sonhei (acontece muito quando durmo demais), acordo sempre com a sensação que estava a "viver outra vida", o que é muito bom quando a nossa vida está "parada" (entagnada numa fase). :)
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