É uma coisa para
qual a vida adulta nos empurra. Torna-se
insustentável ser uma pessoa diferente. A arte bem que tenta convencer-nos do
contrário: de que a diferença é o esqueleto de qualquer ser vivo. Nós também, até que nos esforçamos, de várias formas, para parir esse eu diferente em pequenos
casulos amnióticos.
Mas fora desses
espaços protegidos, torna-se uma tarefa herculeana aceitar essa diferença com serenidade. Digamos que a
mesma fica bem desde que haja por detrás um sistema de suporte sólido; seja ele
económico ou social. Agora a diferença
sem rede; aquele que se exibe por vezes com violência; essa não tem nada de
glamour nem new age.
E se me demoro
nessas considerações é que fui ontem a uma consulta no Hospital Júlio de Matos.
Fui à consulta de Hiperactividade Adulta. Foi-me dado uma receita para adquirir
Ritalina. Passei parte do serão a ler
coisas na net acerca da ritalina:
Havia ali muito discurso “anti” por a mesma ser habitualmente ministrada a
crianças hiperactivas e achar-se que aquilo era uma espécie de lobotomia:
sinais de uma sociedade doente, ao ver de muitos.
Portanto aqui estou
eu, nas minhas primeiras horas deste admirável mundo novo sob o efeito do psicotrópico. E devo confessar que
estou bastante confortável. Volto a sentir a sensação de controlo; sair deste
buraco negro de apetências e pulsões. Sinto abrirem-se a mim as portas de um
dia-a-dia adulto e mais responsável.
É claro que numa
perspectiva filosófica, me junto aos detratores desta sociedade que me levou a
ver na minha diferença um defeito. Mas os factos são esses: não há na minha
vida espaço para mais diletantismo; tornou-se sofrível este ser folha à tona da
água; essa vida de reformado sorvedoura de energias e sonhos.
Passei muitos anos a
cuidar de uma ramagem virada para o céu; quero agora regar as raízes e o
tronco. É isso, árdua tarefa esta agora
de virar a árvore e fazer dos ramos raízes.
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