Da mesma forma como o carro foi o ícone do fim
do século passado, eu diria que o melhor símbolo do hoje seria o iphone.
Sim, sei que me refiro a uma ínfima minoria
mundial mas que não deixa de condensar muitos dos aspectos que tipificam a
época.
Já vos ocorreu questionar o que é que ficará
na história como imagem marcante deste início de século?
Pois eu acho, como já aqui disse e redisse, que
a aceleração do tempo e fragmentação do espaço são dos aspectos que mais
alteraram o nosso quotidiano. Fazer uma coisa de cada vez, passou a ser um luxo
para os fins de semana. Para quê estar
só aqui quando se pode ao mesmo tempo cuscar num ápice a caixa mail ou o facebook?
A verdade é que se me roubassem hoje o meu iphone, acederiam a um conjunto de dados
e hábitos bastante pessoal. Acordo com ele, ou seja com uma pré-selecção de
rádios e músicas que já se tornaram íntimas das minhas manhãs; gravo uma série
de coisas ao longo do dia: o shazam
imortaliza aquela melodia; a câmara aquele pormenor; o bloco de notas aquela
ideia fugidia... Não há como contestá-lo: é prático.
É claro, para aqueles que me conhecem, que vem
aí um mas...
Mas... Sem aqui querer alimentar nenhuma visão
essencialista do homem puro também não quero tornar-me o apêndice desta terceira
mão. É que com muita facilidade, deixamos que este conjunto prático de
acessórios se substitua a outras vontades ou necessidades. É muito fácil, em
nome dessa mesma facilidade, cair numa relação acrítica e passiva face a esta
constante interação. Revejo no iphone
e nessa sublimação da multiplicidade interativa uma das melhores caricaturas do
ser homem em 2012.
O problema é que esse mesmo homem tornou-se um
aglomerado de angústias; este sentir que a vida é um carrossel imparável do
qual é cada vez mais difícil sair; a liberdade ser um conceito cada vez mais
abstracto e balizado.
Eu falo na condição de uma espécie de “flâneur
à la Baudelaire” ou seja de um ser meio bastardo que vive em margem das coisas
e por isso não me sinto totalmente apanhado nessa dança. Até me digladio muitas vezes para entrar no
carrossel da vida adulta. E, por isso, sei que este cenário semi-aditivo que
imputo à terceira mão é questionável e domável. Mas não deixo de achar que o
modelo fácil-prático expõe muitos dos meus contemporâneos à doença da época.
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