Tocou o
despertador... Liguei a rádio no iphone;
estava uma voz feminina a explicar qual o segredo para não se ter conformado ao papel de vítima face a uma
avalanche de azares e problemas. A resposta foi simples: “Criei as condições
para poder ser optimista”
Gostei.
Decidi que este
haveria de ser também o meu lema: criar as condições para ser optimista.
Uma escolha simples
mas que implica decisões difíceis.
Voltando à voz feminina do despertar, prosseguia dizendo ter integrado
atenções relativas ao corpo e ao respeito de si; a isso juntavam-se cuidados ao
nível daquilo e de quem se rodeava.
Aí surgiu-me logo a
figura do meu amigo A.
Tem sido um processo
complicado este. Já lá vão vinte anos que encontrei um irmão na pessoa do
A. Partilhámos imenso para não dizer
tudo. Sempre fomos muito diferentes numa
série de coisas, e nunca foi uma amizade pacífica. O A é um tipo viral que
raras vezes deixa os outros indiferentes.
A mim, era uma pessoa que me irritava; tornava-me impaciente.
E os anos não foram
ajudando. É algo que não sei explicar.
Cheguei a imputar isso à extrema proximidade que nos ligava. A verdade é que não há motivos cabais que
expliquem a vontade que foi nascendo em mim de me afastar do A. O rapaz é, de
facto, uma pessoa com valores pelos quais se rege no seu dia-a-dia; acredita
nos seus sonhos e luta por eles; é um homem de afectos com um peito enorme; precisa
que o abracem e que lhe dêem amor; é uma pessoa bonita.
Mas é uma pessoa
muito agarrado ao que tem e com medo da mudança; foi-se instalando num discurso
e numa atitude. As nossas conversas há muito que deixaram de apontar para
soluções. Era suposto que nada disso pesasse face a vinte anos de partilha e
de confiança. Mas pesou.
Fiz como a tal voz
feminina do despertador: decidi, ainda que sem saber ao certo porquê,
afastar-me do A. A questão aqui é também aprender a ouvir-me. Há notoriamente
algo que não me faz bem dentro desta interacção. Não creio que a amizade seja isso. Não gosto
da pessoa que sou quando fico impaciente ao lado dele. E é verdade que a
companhia dele também deixou de me ser agradável.
Será o suficiente
para me afastar?
Logo numa altura em
que ele enfrenta uma série de dificuldades.
Não é
uma decisão fácil. Mas também não creio que manter uma proximidade em nome de
um passado seja um argumento de peso. Ainda esta semana
ouvi dizer “os maridos passam, os amigos ficam”. Pois não sei: será que essa
fidelidade corporiza a substância de uma amizade?
Eu nem na família
acredito que haja amores incondicionais; Não sei se é saudável sermos acríticos
face àquilo que nos alimenta a alma e os dias. Temos o direito de escolher.
E vou mais longe:
sem querer aqui dissimular o egoísmo que preside às minhas escolhas, também
acho que este meu amigo precisa urgentemente de operar um conjunto de mudanças
profundas na sua vida. Não me apetece caucionar um modo de vida que eu acho
desajustado. Não serei bengala deste quotidiano.
No meio de tudo
isso, onde ficam as juras passadas de amizade e de fidelidade?
Poderei aqui dizer
que estarei ao lado dele se um dia as coisas correrem mesmo mal?
Não se trata de ir
ao funeral; trata-se de viver o luto.
Então e se correrem
bem? quererei lá estar?
Não se trata de ir à
boda, trata-se de viver o namoro.
Enfim, um sem fim de
dúvidas face ao qual só me resta escutar-me. Para um tipo cuja cabeça sempre
foi o cockpit, deixar a aeronave guiar
não é coisa fácil.
Para quem apregoa o dever de optimismo, não sei se este contributo terá sido dos mais proveitosos.
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