Vou, com este texto,
proceder à seguinte experiência: proponho-me partilhar uma reflexão que me desconfortou
sem saber, ao certo, onde é que a mesma me levará. A ideia é explorar a escrita
como forma de construção ou quiçá revelação de significados.
Pois o desconcerto
centra-se num episódio ocorrido ontem nos balneários da piscina que frequento.
Estava eu a vestir-me depois de ter tomado um duche quando reparei numa
criança, dos seus oito ou nove anos de idade, que o pai estava a vestir perante
a passividade da mesma. Enquanto o pai se atarefava da melhor forma, o filho
mantinha um olhar fixo e curioso sobre os restantes homens adultos que ali
revelavam a sua nudez.
Numa perspectiva
exterior, diria ser normal uma criança, não contaminada por pudores de adulto,
observar aquele corpo crescido, habitualmente escondido pela roupa. Mas passa-se que enquanto objecto daquele
olhar não consegui manter essa perspectiva exterior. Antes pelo contrário, saí
quase que enfurecido daquele balneário. E a questão que aqui coloco é: porquê?
O que é que aquele
olhar infantil poderia representar para mim?
Pois poderia aqui
evoluir pelo caminho das crianças que, devo assumi-lo, me podem irritar com
facilidade quando inundam espaços públicos com barulho e entusiasmo. Mas não
era este o caso.
Poderia ainda explicar a minha irritação pelo facto de não me ser agradável ser observado enquanto estou nu ou parcialmente despido. Mas já foram alguns os cenários em que escolhi estar nu junto a desconhecidos sem que isso me fosse desconfortável.
Não, não creio que
sejam essas as razões. Mais facilmente me oriento para o facto de ser ali sujeito
passivo de uma observação activa; de não
ser conivente na usurpação da minha intimidade.
Um ponto que, por outras palavras, nos conduz a uma noção basilar para
mim: a de intimidade e de direito ao pudor.
Estamos aqui a falar
da causa pela qual decidi criar um pseudónimo para me poder expor “por inteiro”
neste blogue. Ou seja, só enquanto não
for reconhecido é que me permito falar sem pudores; na hora em que sou
socialmente reconhecido, entram de imediato filtros e máscaras sociais a
respeitar.
É verdade que a fronteira do pescoço está hoje bastante patente. Temos, por exemplo, sites de encontro para adultos em que só aparecem corpos e temos depois redes sociais em que só aparecem caras. O entre-dois, já é do foro de uma intimidade consentida.
Será esta separação
saudável?
O que é que nos leva
a esconder o sexo e não o resto?
... Não sei.
Só sei que a
curiosidade daquele miúdo confrontou-me
à minha própria curiosidade face aquilo que me é escondido. E acredito que aquele olha infantil trouxesse
luz aquilo que me habituei a ver como o lado obscuro das coisas.
É isso, talvez deva
admitir que me fui afeiçoando aos fantasmas que escondo no armário.
Pois confesso que não fiquei fã do exercício de escrita às cegas mas assumo o resultado e não irei proceder a ajustes.
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